quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Frankenstein

Uma amiga me contou a história de uma menina que termina o trabalho todos os dias, e passa mais um tempo fazendo um relatório para o chefe de todos os furos que a empresa tomou naquele dia da concorrência e o que se pode fazer para melhorar. Eu não consigo achar isso legal, sério. Uma menina de uns 20 e poucos anos que devia estar na praia, no cinema, dormindo, fazer hora extra para apontar erro dos outros. Porque furo dela é que ela não aponta.

Eu não sei em que momento da história inventaram que é preciso ser ambicioso a esse ponto, ao ponto de jogar todo o resto no lixo e dedicar todo o seu tesão, sua energia e seus bons anos de vida exclusivamente a trabalhar e ganhar dinheiro. Sou pouco ambiciosa? Será que talvez não ser ambicioso é que seja bom?

O pior é que eu escrevi sobre isso tanto tempo que me sinto em parte criadora do monstro. Uma espécie de Victor Frankenstein dos coxinhas. Triste.


quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Quase-cigana

No trabalho, um amigo (que já trabalhou numa editora) vive tentando me convencer a escrever um livro de memórias. Ele já deu título pro livro ("As Coisas que Vi e que Vivi", hahahahaha) e jura que me consegue uns prefácios bãos

O fato é que, pensando ironicamente no assunto, eu quase que tiro um roteiro para uma temporada inteira de programa de humor absurdo. Tem horas que eu me sinto aquele personagem do Peixe Grande, ou o próprio Forrest Gump, de tantas coisas incríveis que já aconteceram comigo.

Uma delas foi quase ter virado cigana (e eu só lembrei dessa história porque li umas notícias sobre uma família cigana acusada de raptar uma criança). Gente, eu quase fui batizada cigana numa praia whatever do Rio de Janeiro.

A história é assim: perto da minha casa em Minas, tinha um centro de cultura cigana. Era pra ser uma ONG mas acabava funcionando como um lugar onde davam festas, cursos de cartomancia, quiromancia (até yoga tinha), e onde faziam atendimentos. Era bizarro, mas eu tinha 18 anos e achava o máximo.

Daí que o cigano-chefe lá um belo dia me convidou para ser Diretora de Marketing e Comunicação do centro (coloquei em letra maiúscula para reforçar o absurdo). Eu, meio que rendida e envergonhada pelo que deveria ser percebido como uma homenagem, aceitei. E minha primeira missão foi ir à Câmara Municipal tentar convencer um vereador X a entrar com um projeto de lei a favor dos ciganos. O que, no alto da minha incompetência juvenil, obviamente não consegui.

Passou o tempo (algumas semanas, meses, jamais saberei) e, um belo dia, fui convidada para virar cigana. Com direito a viajar para o Rio, passar a noite ao relento na praia e, depois de algumas festas e celebrações, virar cigana. É óbvio que eu topei. Achei tudo muito legal até o dia em que vi que não tinha dinheiro pra ir. E tava meio com preguiça. E aí não falei nada: só sumi. Nunca mais apareci no centro. 

Certifico e dou fé que é verdade.

Depois conto mais histórias, beijos.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

O que está acontecendo com as pessoas?

Eu nem sei quando começou. Mas foi assim: de repente, a amiga de uma amiga reclama que a babá noturna era uma egoísta porque pediu demissão justamente no momento em que ela, grávida do segundo filho, mais precisava. Isso mesmo, BABÁ NOTURNA. Isso mesmo, EGOÍSTA.

Aí de repente um taxista começa a falar que quem anda de ônibus tem mais é que se ferrar porque teve preguiça de trabalhar e comprar um carro. E uma amiga reclamando porque vai ter que dividir o iPhone em, sei lá, 3 ou 4 prestações. Sendo que no ano passado ela comprou à vista. E, sabe, aquela palhaçada de pessoas postando foto de prato de comida no Facebook.

Provavelmente as pessoas sempre foram assim e eu coloquei óculos novos. Talvez eu até preferisse a miopia de volta, mas agora não sei se dá mais.

Quando a gente saiu do país, não tínhamos nenhuma ilusão de que seria fácil. Fomos com o dinheiro contado e garantia nenhuma de trabalho. Mas éramos pessoas simples. Gosto de pensar que somos ainda. E morar lá nos tornou mais simples ainda. Porque era assim: fazíamos comida em casa todo dia, não havia desperdício de nada, nem excesso de consumo. COMO TODAS AS PESSOAS. A gente vivia como pobres. Mas não éramos porque tínhamos o suficiente, sei lá.

 Quando a gente voltou, combinamos de que não íamos deixar essas coisas levarem a gente. Que não íamos nos deixar convencer de que não sobreviveríamos sem um carro, sem um ipad, sem um café com brigadeiro gourmet, sem um restaurante fusion. Tem horas que eu sinto que estou perdendo essa luta. Tem horas que eu estou somente exausta de sequer tentar. Tem horas que não sei. Que incompreensão, gente.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Um recomeço

"Minha irmã faz engenharia. Ela é muito estudiosa, tirou dez na prova de cálculo. Aí a minha mãe falou: dá parabéns para a sua irmã, ela tirou dez em cálculo. Eu respondi: e quanto ela ganha? O que ela compra com esse dez que ela tirou?".

E foi assim que eu decidi voltar a escrever. Porque eu ouvi isso tudo e não pude falar. E não podia falar pra ninguém, e isso foi me consumindo o dia todo. E eu vim aqui escrever. Porque sei que nenhuma dessas pessoas vai ler. E mesmo se ler, sabe, foda-se. Apesar de não ser um lindo recomeço, essa foi a história do retorno do meu blog.

PS: Na verdade eu não mudei nada. Continuo com essas neuras todas, angustiada, com vontade de escrever e nada nunca me basta. Nem reconheceria esse recomeço como recomeço. Foi uma pausa técnica para perceber que a gente não foge de si mesmo.