quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A manicure

Eu tenho essa manicure, a Cíntia. Ela é uma menina bem legal e descolada, toda tatuada e com um corte diferente a cada vez que eu a encontro. Ela gosta muito de ler e sempre tá de olho no que está acontecendo no mundo - eu a admiro de verdade porque ela é super batalhadora, mas está sempre de bom humor, além de ter um papo ótimo.

Há uns meses, ela saiu do salão porque tinha conseguido uma oportunidade pra trabalhar numa empresa grande. Ela ia ser uma atendente de call center, mas ia ter um fixo direitinho, plano de saúde, bônus, aqueles benefícios todos de empresa grande. Fiquei feliz por ela, porque na minha visão limitada de classe média que quer ver os outros "crescerem na vida" (com todas as aspas do mundo), ela estava dando um passo adiante.

Depois de um tempo, ela volta pro salão. Diz que na empresa grande, não queriam saber de resolver o problema do cliente, mas sim de bater meta de atendimento. Que quando ela começou a tentar resolver esses problemas, a produtividade dela caiu e os chefes nem deram ouvidos, já foram cobrando. E, além de ganhar pouco, ela passava o dia todo trancada no escritório e ainda tinha que trabalhar aos domingos.

Existe um discurso muito consagrado de que trabalhar em escritório é legal. Eu inclusive acredito que parte das pessoas que lê esse blog também acredita nisso, e que, como eu, também acha que sair de um salão pra ser base da pirâmide em uma empresa grande pode ser um ótimo negócio.

Olhando por essa perspectva (a da manicure), eu vi o quanto estava enganada. O emprego dela é muito bom. Ela ganha fixo mais adicional por unha que ela faz, ela conversa com as pessoas o dia todo e sempre aprende coisas novas (foi ela que me disse isso), tem flexibilidade de horário e pode faltar num dia e compensar no outro. Não tem plano de carreira, nem plano de saúde nem nada disso, mas poxa, ela gosta do que faz.

E nós, da classe média, perseguimos loucamente esse ideal de emprego bom, de crescer na carreira, de trabalhar numa empresa cada vez maior (ou cada vez mais importante), de ter status e grana a um custo muito alto de ter cada vez menos tempo e paciência pras coisas realmente importantes.

Isso me lembrou o caso de um taxista que, nos idos de 2006, me contou que tirava 10 mil reais por mês. Ele era super humilde, não tinha nenhum estudo e morava num bairro longe pra cacete. Não tinha nenhum dos indicadores de status que valorizamos tanto, mas tava lá, montando uma frota de táxi e ajudando todos os parentes e tal.

Eu queria terminar com uma lição de moral linda e florida, mas acho que não precisa.

2 comentários:

  1. Muito verdadeiro isso Vi. Adorei o post. Eita M e tantas outras pessoas, servindo de lição de vida sem nem perceber.

    bjs,

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  2. Sei lá, mas a felicidade é uma coisa diferente para cada um. Tem gente que, cada dia, quer algo diferente, tem gente que todo dia quer a mesma coisa. Eu acho a manicure e a moça do call centre a mesma pessoa: querem ter o doce conforto da estabilidade. Não tem a ver com crescer na carreira. Para mim, tem a ver com os meios e os fins. Ou ela só se deparou com um escritório errado e um salão certo...

    Fer Moraes

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